A Garganta da Serpente

Miguel Regozijo

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O Muro

I

Muro, que te levantas só, no fundo dessa rua.
Encosto-me a ti e penso:
"Como é bom ter-te aqui e estar contigo…"
Como é bom o teu musgo húmido,
A tua pedra fria como neve,
E o teu suporte firme de amigo.

Nem te olham aqueles que por aí passam.
Não se sentam contigo, não ficam…
Como te manténs de pé no fundo dessa rua?
Que força te segura? Cair talvez fosse melhor…
Mas, onde me seguraria eu, se caísses tu…

Pobre monte de pedras, que te sustentas desde os primórdios,
Que viste o que viste e nada dizes.
És o melhor ouvido, o melhor sofá,
A melhor voz e o melhor calor,
Para aqueles que só contam com ela…a solidão.


II

Hoje estou triste, preciso de ti, querido muro.
Saio, e vou até essa rua onde moras…
Onde moras tu e mais ninguém,
Porquê mais ninguém lá quer morar.

Entro pela negra rua, nua de gente, nua de carinho…
Olho lá bem para o fundo…mas onde estás?!
Onde estás querido muro?...
A rua hoje está mais negra ainda…
E tu, jazes no chão, duro,
Negro como a rua.

Uma lágrima cai no chão…
Não sei se tua, se minha…
A escuridão engole-me sem piedade!
Já não há rua, já não há muro, nem destroços…
Isto não é rua, isto não é vida, nem negridão,
É o fim…

Tu nunca exististe meu querido muro,
E eu, nunca estive só…


(Miguel Regozijo)


voltar última atualização: 06/04/2009
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