A Garganta da Serpente

Pedro Fernandes de O. Neto

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CADÁVER'S ADIADOS

Olhos secos
inchados, fúnebres
[outros amarelos, secos]
retr(atos) da fome.
Corpos secos
estirados à sarjeta da África
à cobiçarem comida,
fonte de v(ida).
cadáveres secos-vivos
retratos do des(caso) cobiça.
A mãe África
sem futuro-teto-perspectiva
é um mundo assombrado,
de fantasmas tísicos
secos, do(entes), cambaleantes de fome.
Terra tão rica
fica tão abando(nada)
é lembrada
somente pelo ouro, diamante
roubada, saqueada.
Men(inos) da mãe África
olhos secos de água
lágrimas sustento
dos sonhos abortados 'inda criança
sem esperança de vida [nada]
somente à espera de comida
são cadáveres adiados.
Nas cerca(nias) da fome [sem nome]
mãe África expõe ao horizonte
o rastro sujo de sangue,
o podre lixo, luxo do poder
enquanto uns têm para dar [e não dão]
e vender; outros matam, vendem o que não tem
o corpo.a vida. os sonhos. a alma
para comer, senão matam a si próprios
e se comem.
Urubus nus
de asas abertas
em vôos rasantes
à procura de carniça [certa]
povoam o azul-céu cobiça
azul turquesa [turquesas]
sujo de sangue podre. manchado por pedaços d'alma humanas
[roubado por invejosos. poderosos]
o podre luxo lixo do poder
estampado nos ternos pretos luxo
[italianos]
as caras magras
desamadas. crianças negras
abandonadas.
Continente da desolação
povoado de cadáveres nus
[outros vestidos de mortalhas-trapos]
expostos reforços de uma guerra
que impera [nunca termina]
muitos cotós arrasados pelas minas,
[finos presentes dos americanos
ao povo africano]
esquecido. perdido. lembrado
apenas pelos urubus nus
nos seus vôos rasantes
à procura de carniça.
Talvez 'inda
por entre a carnifi(cina) da mãe África
um senhor deus dos desgraçados,
pobres. oprimidos e flagelados
crie vergonha do abandono
res(surja) da podridão
riaque da mente o poder-abono inveja
resgate a história perd(ida) de vida
de um povo faminto
corpos. ossos. esqueleto
e sopre o vento-verbo-vida, esperança
para que estes
que nesse instante
nascem não caiam
no[a] vale/vala da morte/guerra
e lá sejam esquecidos [sozinhos sepultados]
dado por perdidos
zumbis vencidos
perdidos do caminho trono celestial de seus deuses
e do nosso
que um dia disse sê-los negros [sem alma]
deus cruel, e
sejam jogados ao léu [não] sem morada
sem vida-projeto, sem nada.


(Pedro Fernandes de O. Neto)


voltar última atualização: 11/03/2008
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