A Garganta da Serpente

Samoel Bianeck

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Criança: "Porque não posso Sorrir?"

I
Criança que faz arte, levanta e parte - vai para marte.
É seu estandarte; a flecha e o bacamarte - um peixinho espadarte.
Alegria reparte e coleciona no encarte - me livra do enfarte.
A felicidade comparte; não quando a tocaste - chora porque a ansiaste.

II
No mundo tem a missão, muita ilusão - um grande coração.
Sofre aflição; foge da agressão - detesta injeção.
Criança alta ou não; no desenho o cascão - sofre o anão.
Sofre opressão; dói o pai na prisão - trilhou a perdição.

III
Muda e sem audição tem aptidão - será um artesão.
Criança com intuição, sofre a intimidação - sangra no arpão.
Dói a luxação, se tomam seu pão - já tem marcas da mutilação.
Sente a judiação; o professor mandão - o pai patrão.

IV
Criança inteligente; sempre comovente - sabedoria de descendente.
Mesmo doente, sempre contente - é sempre onipotente.
Na vida crescente; não tem contingente é crente - mesmo carente.
De todos confidente; da sabedoria expoente - sua voz é fluente.

V
Criança valente, sentinela vigilante - vidente e saliente.
Pura e inocente, brinca com o pente - gosta de refrigerante.
Na ajuda é assistente; sempre conseqüente - não foge do batente.
Estuda bastante; limpa e escova o dente - com o banho exigente.

VI
Criança que ama o pai, chama quando diz ai - anda e também cai.
No colo sempre vai, pede carinho papai! - também o distrai.
Diz o pai: com anjos sonhai; a benção alcançai! - Oh! anjos cantai!
Mãos; aos céus levantai, olhos; para o alto olhai! - nas nuvens navegai!

VII
Criança desaparecida de todos esquecida - mal vestida.
Diferente e parecida, com saúde e ferida - oh! senhora Aparecida!
Clara e enegrecida, alegre e aborrecida - a queixa é quando ferida.
Entristecida, sem alimento abastecida - com fome dói a barriga.
Feliz pela vida, mas triste por ter nascida - chora sem saída.

VII
Que levanta de madrugada, trabalha algemada - fica aleijada.
Do pai a chinelada; do padrasto apalpada - a inocência ultrajada.
Criança acoitada, judiada - pela mãe desrespeitada.
Pela madrasta abusada ou no mundo largada - pelo mau é puxada.

VIII
Infância mal passada, por muitos pisada - no escuro é tragada.
Criança da pesada, molhada, mal olhada - de lado é deixada.
Do lar arrancada, pé na estrada - é longa a caminhada.
Com isca cevada; com droga viciada - na vida tatuada.

IX
Criança feliz; brinca no chafariz - outras com o giz.
Vou ser atriz, arrumar o nariz - olha os quadris.
Vou ser um Juiz; no sapato verniz - serei bom aprendiz.
Ou embaixatriz; vai! Deus te quis - fica longe dos imbecis.

X
Criança linda, seja bem-vinda - outras, não ainda.
Fique na berlinda; o espelho te blinda - mas não finda.
Os olhos do mundo brinda, mas é cedo ainda - vem minha linda.
Sua infância intervinda; do amor não cinda - mas é cedo ainda.

XI
Criança! seja forte, te desejo sorte - homem deporte.
Pratique esporte; vá até o norte - use o transporte.
Não se importe, as dificuldades recorte - de frente aporte.
Tire o passaporte, nas dores suporte - ferramentas importe.

XII
Criança! virão as dores; mas também as flores - mais tarde amores.
Vem os caçadores, os roedores - cuidado nos bastidores.
Verão os ditadores, fuja dos raptores - a escada dos horrores.
Tem os palpa dores, sobem os elevadores - finalmente os matadores.

XIII
Criança adotada, bem dotada - a mal tratada.
Criança achada, aleijada - pelo mundo abalada.
Criança inventada, pelo frio gelada - sem roupa desnudada.
Expatriada, bombardeada, sem lar pisada - pela dor picada.

XIV
Criança salgada, pela ignorância tapada - na tristeza selada.
Criança violada, do lar tirada - por ser pobre zombada.
Criança da calçada, sem esperança sentada - a zombam de safada.
Criança da beleza cegada, a vida a ela foi negada - pobre desgraçada.

XV
Criança querida, para ela sorri a vida - do conforto embebida.
Nunca teve lombriga, no berço de ouro foi trazida - no conforto parida.
Sem dores acolhida, seus desejos sem medida - seu pai tem uma jazida.
No conforto desmedida, desconhece a dor da vida - cuidado! tem descida.

Epílogo:
Desculpe; também não era o que eu queria.
Pensei fazer um poema feliz para quem lia.
Que tivesse motivo para que ao ler você sorria.
Sobre criança só tem temas que me angustia.
O mundo tem sido muito mau com suas criança.
E em muito poucos rostinhos pode se ver alegria.
Precisamos gritar hoje; para no futuro ver esperança.


(Samoel Bianeck)


voltar última atualização: 07/05/2007
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