Cantilena
Quando a tarde morre no velho Bixiga
não sei, cara amiga, que coisa me dá,
apenas que levam-me os pés traiçoeiros
com passos ligeiros à Casa de Yayá...
meu peito cordato também não espera
que siga-lhe a fera, temida vergonha...
aos olhos me oculta das ruas o brilho,
qualquer empecilho que se lhe interponha;
de um longo caminho, cansado, enfim chego
e o meu vão sossego se esvai num minuto:
as mãos já me suam, minha voz se cala...
mal adentro à sala, Carina, te escuto!
Junto à porta, ao lado de jovens donzelas,
entre outras singelas sopranos, te avisto
e eis que vejo a causa do meu grão tormento,
o são fundamento pelo qual existo!
Ai, lança à minha alma qualquer cantilena
que o teu canto ordena que a mágoa se afaste!
O canto que entoas mil encantos obra
e em dobro recobra-me a paz que roubaste;
mas, se alguém no Coro rebaixa o teu canto
a voz já levanto num tom furioso,
a sua insolência logo eu repreendo,
com gosto defendo teu dom valoroso...
é que na alma acende-se em tua presença
uma flama intensa que eu nunca senti...
Ah, bela Carina, perdoa o teu vate:
meu peito arde e bate de amores por ti!
(Thiago Amorim)
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