A Garganta da Serpente

La Fontaine

Jean de La Fontaine
  • aumentar a fonte
  • diminuir a fonte
  • versão para impressão
  • recomende esta página

A raposa sem rabo

(La Fontaine)

Uma ladina Raposa
Caiu em certa armadilha,
(Que sempre as tece o Diabo!)
E foi grande maravilha
Ficar apenas sem rabo:

Com tal perda envergonhada,

De a coonestar busca a idéia;
E as sócias vendo uma vez
Juntas em grande assembléia,
Lhes disse muito cortês:

- Sabei qu'os cães destes sítios,

- Qu'há dias tenho encontrado
- Por esta campina toda,
- Tem cércio o rabo cortado,
- Que me faz crer qu'isto é moda;

- Se é moda (falo-vos sério)

- Nunca vi cousa mais útil!
- De que serve dizei vós,
- Trazermos um peso inútil
- Pendurado atrás de nós?

- Um rabalhão gadelhudo,

- Que nos faz calma no estio,
- E lá pelo inverno todo
- Nos dobra, e exaspera o frio
- Ou cheio de água, ou de lodo?

- Por tanto eu vos aconselho,

(E deixemos questões fúteis)
- Qu'o rabo cortemos todas;
- Pois quando as modas são úteis,
- É útil seguir as modas.

Uma Doutora do rancho,

Mestra em astúcias antiga,
Lançando-lhe a vista em roda
Lhe diz - Ora aposto, amiga,
- Que tu já usas da moda?

- Deixa ver, dá meia volta,

Eis qu'então a derrabada,
Disfarçar-se não podendo,
Ao som de grande assoada,
Dando à gambias foi correndo.

Que de um delito afrontoso

Em si o ferrete imprime,
Com achar parceiros conta;
Crendo qu'a mancha do crime,
Sendo usual, pouco afronta.

(fonte: "Fábulas de La Fontaine". Tradução: Curvo Semedo
Rio de Janeiro: Editora Brasil-América - EBAL - SA, 1985)

Copyright © 1999-2020 - A Garganta da Serpente