A Garganta da Serpente
Veneno Crônico crônicas
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DEMÊNCIA PROGRESSIVA

(Géber Romano Accioly)

É triste! É realmente muito triste constatar que, com o passar dos anos, progressivamente, vou perdendo a capacidade intelectual e cada vez mais e mais vou sendo atingidos pela demência.

Era moço e o meu raciocínio era rápido e eficaz, sou idoso e não mais entendo com a presteza e eficácia necessárias.

As coisas simples e corriqueira, para que sejam compreendidas em toda sua profundidade, me causa canseira pelo esforço despendido.

Fica muito difícil entender a intelectualidade que há em um programa de auditório do tipo "Domingão do Faustão" ou "Domingo Maior" e quejandos, pelo simples fato de não mais entender o alto nível cultural a que se propõem.

É duro! É muito duro não mais conseguir captar as sábias mensagens de uma Ana Maria Braga, de uma Hebe, de uma Xuxa, de uma Eliana, e quejandas por absoluta falta de entendimento de minha parte.

Não entender os edificantes ensinamentos grafados em uma "Amiga", em uma "Querida", em uma "Quem" é realmente frustrante para, mim, anoso demente.

Não sabem os moços o esforço que faço para tentar captar as sublimes mensagens do Ratinho, do Pedro Paulo, do Nelson Rubens, e pares em virtude da minha acentuada deficiência intelectual.

Não mais sentir, em virtude da progressiva demência que vai se apossando de mim, a magnífica mensagem de uma "Amor de Rapariga" ou "Moranguinho do Nordeste", não mais nos me deleitar com a melodia de um "Amor, i love you", não mais ficar encantado com "Vai descendo na boquinha da garrafa" ou "Cuidado com a vassoura que é pior do que cenoura" me dá a certeza de que realmente estou superado.

Não consigo entender o cuidado com a minha salvação espiritual que têm os nossos líderes intelectuais, as nossas autoridades políticas que me mantém sempre pobre, pois se rico, certamente arderia no "Lago de fogo e enxofre, onde só há pranto e ranger de dentes".

Não entender por progressivo apoucamento, dos modernos relacionamentos conjugais onde não se sabe quem é quem, não perceber o sublime que há em um "casamento aberto", não perceber o de magnânimo que há em um par no qual a idade de um deles é duas, três, quatro vezes maior que a do outro é por demais constrangedor.

Não entender o quão de maravilhoso e transcendental há em se merecer todos os itens das bem-aventuranças causa em mim uma dor maior que a dor de candidato político derrotado pelas urnas.

Felicidades, prazeres, belezas e alegrias modernos não são, por mim, entendidos pelo simples fato de estar constatando que infelizmente, estou ficando demente e apoucado. Ou não?!

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