Quem João, o Batista, chamava de "raça de víboras"?
Quem Jesus, o Cristo, comparava a "sepulturas"? Que representa a Catedral
de "Notre Dame" para a fé cristã? Que é hipocrisia?
Que tem a ver entre si estes questionamentos?
Victor Hugo ao publicar Notre-Dame de Paris (1831), romance medievalista centrado
na tragédia do corcunda Quasímodo e da cigana Esmeralda, nos deixou
uma mensagem cifrada sobre a hipocrisia. Quasímodo é o nome eclesiástico
da Pascoela e Esmeralda é a gema que representa a fidelidade feminina.
Podemos descortinar nessa tragédia quase autobiográfica, sua ligação
com a jovem atriz Juliette Drouet, que a ele se devotaria até morrer, dois
anos antes da sua, quando fez com que Esmeralda pedisse o auxílio a Quasímodo
tocando o sino que ele nomeara de Juliette.
Há toda uma carga simbólica paradoxal à "sepultura"
que Jesus combatia, pois, ao contrário desta, Quasímodo era "feio
por fora" e "bonito por dentro". Esmeralda, mesmo cigana, mantinha-se
fiel ao amor verdadeiro.
Na afetação de uma virtude que não têm e se aparenta
ter é que está centrada a maldade humana. Dizer sim quando conscientemente
o certo é dizer não é a mais vil forma de hipocrisia.
Hipócrita era o homem ancestral e hipócrita é o homem atual.
A hipocrisia é eterna e existirá enquanto houver quem a cultive.
Os hipócritas conseguem ser hipócritas até quando têm
certeza de não serem hipócritas. Ser hipócrita é negar-se
a si mesmo, e de uma forma visceral. Percebe-se no "como você está"
corriqueiro o quanto há de hipocrisia quando se responde o "estou
bem".
São hipócritas quando invadem favelas à cata de fiéis,
para anunciar-lhes que hipócritas anteriores prometeram paraísos
riquíssimos depois de se morrer.
São hipócritas quando piedosos pelos simples fato de manterem, sempre
e sempre, os alvos da piedade em condições de necessitar imprescindivelmente
de ajuda por não terem dado a eles meios para progredirem e proverem suas
necessidades.
São hipócritas quando exortam a pobreza aos pobres de espírito
com falsas alegações de pretensos deuses pobres para que a riqueza
seja menos acessível a eles.
São hipócritas quando criam deuses para perdoar castigos que sabem
não existir para fazer com que parcos de instrução sigam
na busca do perdão para eles verdadeiro.
Às claras parecem "puros e limpos de coração",
mas no "tête à tête", à socapa, nos escondidinhos,
nos "por baixo dos panos", no banheiro são impuros e sujos tal
qual "pau de galinheiro".
Não buscam o céu, evitam o inferno e para isso "fazemos qualquer
negócio".
Não respeitam a lei - têm medo da cadeia e para isso usam e abusam
da cega, surda, muda e manipulável justiça.
Não são filantropos, burlam o fisco e para tal criam "institutos",
"fundações", "ongs" e outras "maracutaias".
São hipócritas anônimos. Hipócritas e hipócritas.
Com o "faça o que digo e não faça o que faço"
provam e comprovam que são hipócritas e hipócritas e hipócritas
no significado mais vil da hipocrisia.